TESE NACIONAL DO PPL
22/10/2011 13:31
Informe do Presidente do Partido Pátria Livre, Sergio Rubens, à reunião Diretório Nacional
de 23 de agosto de 2011 – Brasília-DF
Companheiros e Companheiras
No ano de 1928, um ano antes de explodir a Grande Crise de 1929, o poeta e dramaturgo alemão Bertolt Brecht escreveu uma peça de grande sucesso denominada “A Ópera dos Três Vinténs”, uma adaptação da “Ópera dos Mendigos”, do escritor inglês John Gay, produzida duzentos anos antes – em 1724.
Na terceira cena do terceiro ato da ópera de Brecht, um dos integrantes da quadrilha de Mac Navalha, que havia revelado o tino de investir o produto de anos de roubo e contravenção na aquisição de um banco, explica a seus pares as vantagens do novo negócio: “O que é roubar um banco, comparado a fundar um banco?”
Oito anos depois, em 1936, num discurso no Madison Square Garden, quando disputava a primeira das três reeleições sucessivas, o presidente Franklin Roosevelt, que travava uma luta de vida ou morte contra os monopólios financeiros que haviam mergulhado os EUA e em seguida o mundo capitalista na Grande Depressão, afirmava: “Agora sabemos que o governo pelo dinheiro organizado é tão perigoso quanto o governo pelo crime organizado. Nunca antes na nossa história
essas forças estiveram tão unidas contra um candidato. Elas são unânimes em seu ódio a mim - e
eu saúdo esse ódio”.
Ao contrário de Brecht, Roosevelt não era marxista, mas não era cego. E percebia com bastante nitidez a natureza degenerada dos monopólios privados capitalistas - especialmente os financeiros, cujo ideal ético foi sintetizado em termos um tanto brutais, porém precisos, por um de seus ilustres precursores, o barão de Rothschild: “Quando houver sangue nas ruas, compre propriedades”.
John D. Rockefeller, J. P. Morgan, Jay Gould e outros vinte potentados da segunda metade do século 19 não ganharam de seus conterrâneos o sugestivo epíteto de “robber barons” – barões ladrões – pelo seu respeito e compromisso com a coletividade. E eles podem ser considerados cândidos amadores frente aos atuais beneficiários da “arquitetura financeira” dos derivativos.
Agora, meus camaradas, eu pergunto: É possível realizar um governo para o povo e pelo povo sem contrariar essa gente?
É possível realizar um governo para o povo e pelo povo correndo atrás da aprovação e aplauso dos representantes do dinheiro organizado? É possível realizar um governo
para o povo e pelo povo sem travar uma luta diária para ao menos conter e manter dentro de
certos limites a ação destrutiva desses elementos sobre o conjunto da economia e da sociedade?
Não é não, camaradas. E se alguma dúvida houvesse bastaria atentar para o triste estado de Barack Obama, que corrompido pelo “lado obscuro da força” – isto é, pelo poder dos monopólios financeiros – vai percorrendo celeremente a trajetória que marcou a transformação de Anakin em Dart Vader.
As promessas de paz, que empolgaram a campanha eleitoral de 2008, se converteram nos sucessivos adiamentos da retirada do Iraque; na multiplicação dos efetivos militares no
Afeganistão; na suspensão da desativação da infame prisão de Guantánamo; na execução sem
simulacro de julgamento, seguida de ocultação de cadáver, de um Osama Bin Laden preso e
desarmado; nos criminosos bombardeios da OTAN contra o povo líbio, para se apoderar do seu
petróleo; nas manobras para impor à Síria um governo dócil aos caprichos de Washington; nas
descabeladas pressões para forçar a China e demais países do mundo a valorizar suas moedas de modo a facilitar a penetração de importados “made in USA” e dólares sem lastro oriundos das superemissões; nas provocações, ameaças e sanções contra o Irã, Coreia Popular, Cuba e quem mais não se dispuser a bater continência a uma ordem imperial injusta e decrépita.
O fato é que sob Obama o imperialismo norte-americano busca compensar a monumental crise econômica que lhe devora as entranhas mostrando-se mais agressivo do que nunca.
Ao invés de enfrentar a crise concentrando os recursos públicos na geração de empregos, salários, em produção capaz de expandir mais rapidamente o mercado interno, e criando uma regulamentação que freasse a fuga de capitais para a especulação, como fizera Roosevelt, Obama fez o oposto.
Manteve a política de Bush, dos primeiros meses da crise de 2008, a de transferir os
recursos do Estado aos monopólios e manter intacta a desregulamentação engendrada pelo
neoliberalismo. Os representantes do dinheiro organizado agradeceram, mas não destinaram um níquel desses recursos para reativar a produção, preferiram utilizá-los em novas oportunidades no ramo da especulação. Para lá eles haviam fugido atrás de extraordinários lucros que a produção num mercado garroteado por anos de congelamento de salários não tinha como oferecer. A ciranda especulativa provocou a quebradeira. Mas é aí que o dinheiro organizado vai permanecer, enquanto não for obrigado a deixar o cassino. E os 25 milhões de empregos perdidos nos EUA com a crise continuarão a pesar sobre os ombros da população desempregada.
A sangria de recursos públicos a fundo perdido ou juros negativos para os monopólios financeiros e o vício com as guerras fizeram a dívida pública dos EUA disparar de US$ 10,3 trilhões, em 2008, para US$ 14,4 trilhões, em maio de 2011 – 40% de aumento, em dois anos e cinco meses.
O déficit comercial de um país que se deu ao luxo de estimular seus monopólios a transferir plantas industriais para outros países, a fim de explorar mão de obra mais barata e exportar de lá para o seu próprio mercado, também não tinha como parar de crescer. Depois de um recuo em 2009, em função do refluxo da atividade econômica, ignorou a recessão e retomou a escalada: US$ 695,9 bilhões, em 2008; US$ 380,7 bilhões em 2009; US$ 497,8 bilhões, em 2010.
A solução de Obama foi transformar em política de Estado a guerra cambial deflagrada pelo FED desde o final de 2008, ou seja, a depreciação do dólar através de superemissões unilaterais transferidas aos monopólios financeiros no intuito de oferecer-lhes novas oportunidades de especular ou adquirir ativos, particularmente em outros países. E não é preciso ser economista para perceber que a valorização artificial das moedas de quem hesita em se defender desse tipo de agressão sacrifica, invariavelmente, suas exportações em favor das importações.
Em novembro de 2010, após a vitória, mas antes da posse de Dilma, Obama compareceu à reunião do G-20, em Seul, para expor ao mundo as vantagens da nova superemissão de US$ 600 bilhões (a QE2), anunciada pelo FED, 10 dias antes da conferência.
Ele disse: “Isso não é bom apenas para os Estados Unidos, é bom para todo o mundo”. E
acrescentou: “Quando todas as nações fazem a sua parte, todos nos beneficiamos de um maior crescimento”. Ou seja: a parte que vos cabe é se sacrificar agora absorvendo nossas exportações para que possamos sair da crise, o nosso crescimento virá em vosso benefício.
Não colou. 19 dos 20 países representados no encontro rejeitaram o presente e criticaram a
política de superemissões. Dilma e Lula estavam lá. É da presidenta a seguinte declaração: “A
política do dólar fraco faz com que o ajuste norte-americano fique na conta das outras economias, e a nossa moeda ser a mais valorizada não é bom para o Brasil”. Em abril de 2011, quando esteve em Pequim, na cúpula dos BRICS, a presidenta afirmou: “Sabemos perfeitamente o porquê [do problema cambial no Brasil], todos nós sabemos. Vai desde a política de quantitative easing [as superemissões de dólares dos EUA] até o fato de que o Brasil ainda opera com taxas de juros mais elevadas do que o resto do mundo”.
Curiosamente, na época da reunião de Seul, a segunda maior taxa de juros (reais) no mundo era a da África do Sul (2,4%). A do Brasil era pouco mais do que o dobro. Hoje, a taxa de juros (reais) do Brasil (6,8%) é sete vezes maior que a da África do Sul (0,9%). O diferencial de juros do Brasil em relação aos demais países cresceu vertiginosamente. Praticamente todos se defenderam reduzindo suas taxas, e hoje apenas nove as têm acima de 0%. Mas esse é um assunto que retomaremos à frente.
“A meta dos EUA [com as superemissões] é aumentar as exportações dos atuais US$ 1,57 trilhão para US$ 3,14 trilhões em 2014, será o maior aumento que um país já fez”. A
afirmação é do chefe do Conselho de Assessores Econômicos de Obama, Austan Goolsbee, e foi feita às vésperas do encontro do G-20, em novembro de 2010.
No entanto, tamanho é o estado de corrosão da economia americana, com sua política de tudo para os monopólios financeiros e nada para o povo, que apesar da guerra cambial a performance das exportações apresentou no mês de junho a segunda queda consecutiva de 2011, ficando em US$ 170,9 bilhões (resultado anualizado: US$ 1,83 trilhão). O déficit, também no mês de junho, aumentou para US$ 53,1 bilhões (resultado anualizado: US$ 637,2 bilhões).
O Brasil é um dos raros países cujo saldo comercial com os EUA se transformou em déficit, em função da guerra cambial. De saldos da ordem de US$ 10 bilhões, atingidos nos anos de 2005 e 2006, passamos a menos US$ 4,4 bilhões (2009), menos US$ 7,7 bilhões (2010) e menos US$ 4,0 bilhões no primeiro semestre de 2011 (ou menos US$ 6,0 bilhões, se levarmos em consideração a tabela do U. S. Bureau of Economic Analysis – BEA).
Houve quem se defendeu bem e quem se defendeu mal da agressão cambial. O Brasil não está entre os primeiros nem entre os segundos, porque, simplesmente, ainda não se defendeu. Manteve a excrescência do “câmbio flutuante” e, paralelamente, escancarou-se para receber a enxurrada de dólares, conforme a máxima do ministro Mantega de que “pior do que excesso de dólares seria a falta deles”. Resultado: passamos a perder no câmbio depreciado não só para os EUA, mas também para os demais países que em maior ou menor grau defenderam suas moedas, o que explica a invasão dos importados “made in qualquer lugar do mundo” e o recuo da nossa indústria. Essa é uma causa básica – embora não seja a única - do crescimento negativo do PIB brasileiro (menos 0,26%) no mês de julho de 2011. E, no caso, não se trata de desaceleração, mas de queda mesmo.
A Europa e o Japão – atores coadjuvantes do campo imperialista - foram arrastados para a crise pela ação dos monopólios financeiros dos EUA e pela de seus próprios monopólios que se deixaram abarrotar pelos célebres derivativos das hipotecas frias que as agências de risco de Wall Street abençoavam como um grande negócio às vésperas da quebradeira, em setembro de 2008.
A política do BCE e do Banco Central da Inglaterra, sob a chancela do FED, de injetar dinheiro nos bancos e remeter a conta para as populações dos países europeus saldarem abrindo mão de suas aposentadorias, empregos, salários, educação e assistência médica gratuita, vem produzindo grandes revoltas e nenhuma perspectiva de recuperação da atividade econômica. E, apesar da rendição da quase totalidade dos governos europeus a essa política, as insistentes manobras da Alemanha e França para forçarem Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha e Itália – por enquanto – a pagarem o preço maior pelo mal denominado “ajuste” estão trazendo para a ordem do dia a implosão da União Europeia.
O Japão, tsunamis à parte, que já havia provado em duas décadas de colapso que quanto mais dinheiro se coloca nos bancos a custo zero mais eles vão em busca do diferencial de juros no exterior (e da especulação com ativos, commodities, terras, ações), continua sem conseguir conceber nada de mais criativo em matéria de política econômica.
Há mais de dois anos temos sido bombardeados com prognósticos de que a recuperação já teve início ou está em vias de começar. A mídia dos países imperialistas publica e a daqui reproduz, com a independência que lhe é peculiar.
Nós, do Partido Pátria Livre, temos estado muito certos em não referendar tais quimeras, até porque cada uma delas se esfuma diante dos acontecimentos do mês ou do trimestre seguinte, e todas se baseiam no estranho conceito de que o emprego será o último passageiro a embarcar no bonde do novo ciclo de prosperidade.
O fato é que a produção dos países ditos desenvolvidos continua distante do patamar de 2008 e as economias dos países que se deixam governar pelo dinheiro organizado – em última instância pelo dólar organizado, em função da pressão exercida pelos monopólios financeiros dos EUA e sua máquina bélica sobre o restante do mundo - se arrastam numa depressão longa e profunda, agravada por políticas que favorecem a especulação dos poderosos e o saque sobre os menos afortunados.
A saída dessa crise não virá dos corifeus do campo imperialista que a provocaram, mas daqueles países que forem capazes de ampliar o controle nacional sobre suas economias e o controle popular sobre seus governos, realizando uma política voltada para o crescimento do
emprego, do salário e da produção, rejeitando a ingerência e a exploração externa, mas também renunciando a qualquer veleidade de empregar tais expedientes contra outros povos, porque mais degradante do que ser explorado é assumir a condição de explorador.
A China e a Índia, é preciso repetir uma vez mais, ignoraram a crise e mantiveram o crescimento acelerado nos anos de 2009, 2010 e 2011, porque apresentam maior grau de independência econômica e política em relação aos monopólios financeiros do eixo EUA-Europa-Japão.
A China cresceu 9,2% em 2009, 10,4% em 2010 e 10,3% em 2011 (previsão). A Índia 9,1% em 2009, 9,7% em 2010 e 9,0% em 2011 (previsão).
O nosso país-continente não tem nenhum motivo para ficar atrás disso, porque não há razão que justifique retardar a conquista da nossa independência plena, em todos os terrenos.
Estamos seguros de que a saída dessa crise está intimamente associada à construção de uma nova ordem mundial que promova uma faxina completa nas instituições multilaterais, a começar pelo Conselho de Segurança da ONU; imunizando-as contra as velhas concepções imperialistas, extremadas por duas décadas de neoliberalismo e Consenso de Washington; tornando-as mais solidárias, igualitárias e zelosas do princípio da autodeterminação dos povos, sem o qual qualquer instituição multilateral não passa de uma fraude.
O Brasil tem diante de si uma larga avenida para avançar. A história nos mostra – ainda que alguns tentem esquecê-la - que as crises do campo imperialista foram os momentos em que o Brasil mais cresceu e mais avançou. O maior inimigo do desenvolvimento nacional, os representantes do dólar organizado, estão mais agressivos, é fato. Mas também estão mais enfraquecidos e desmoralizados pela quantidade de engodos, arbitrariedades e crimes que vem perpetrando à luz do dia contra os direitos mais elementares dos indivíduos e dos povos.
O nosso programa para enfrentar essa situação, pautado nas melhores tradições do nacionaldesenvolvimentismo, é simples e fácil de ser assimilado por qualquer trabalhador, empresário ou intelectual que ame a sua pátria. E pode ser resumido em cinco pontos: Ampliar o mercado interno (mais empregos e mais salários). Reduzir os juros. Concentrar os recursos do Estado para financiar a produção das empresas genuinamente nacionais - privadas e estatais – e dar prioridade a elas nas encomendas. Desenvolver os setores de tecnologia de ponta, indispensáveis à conquista da independência econômica plena. Educação e Saúde gratuita e de qualidade para todos.
Companheiros e Companheiras:
A eleição da nossa companheira Dilma, com 55.752.529 votos. depois de uma vibrante
campanha eleitoral cuja diretriz e palavra de ordem central foi “avançar em relação às conquistas do governo Lula” renovou as esperanças do povo brasileiro em melhores dias.
O presidente Lula passou-lhe a faixa presidencial com o Brasil crescendo a uma taxa de 7,5%, em 2010, e dispondo de um arcabouço de política de desenvolvimento, estruturado principalmente ao longo do segundo mandato, que priorizava a expansão do mercado interno e do investimento público para alavancar a produção.
Projetos estratégicos, como a reativação da Telebrás para promover a universalização da banda larga, a nacionalização do fornecimento de equipamentos para a Petrobras empregar na exploração do pré-sal, a ampliação do domínio e do uso da energia nuclear para fins pacíficos, e outros de forte impacto no desenvolvimento da tecnologia e da engenharia nacional, se encontravam em adiantado estágio de execução ou planejamento.
Avançar em relação às conquistas do governo Lula significava, sobretudo, ampliar o peso do setor nacional na nossa economia em relação ao setor externo que ocupa uma parcela muito além da desejável. E adotar medidas emergenciais de proteção da nossa moeda contra a agressão cambial.
Quanto maior o estoque de capital externo no país, mais elevadas as remessas de lucros e as importações, pois as multinacionais são importadoras natas de insumos e componentes, e isso pressiona nossas contas externas, particularmente em situações nas quais a queda da demanda internacional não permite às exportações crescerem na mesma intensidade. Havendo um desequilíbrio cambial que sacrifique as exportações em benefício das importações, aí é um deus nos acuda. Por isso é imprescindível aumentar o peso do setor nacional na economia brasileira e proteger o real dos ataques especulativos.
Porém, como era de se esperar, as pressões dos representantes do dólar organizado se fizeram sentir antes mesmo da posse. Enquanto Dilma falava em “erradicação da miséria”, o ministro Mantega falava em cortes. Primeiro o do aumento real do salário mínimo. Depois o das contratações e dos salários do funcionalismo. Em seguida, o do crédito e dos gastos públicos com “custeio”, para logo chegar ao investimento público, que “deveria ser reduzido para que o investimento privado pudesse crescer” (?!?!). Como se daria esse crescimento? As empresas emitiriam “debêntures” para absorver os dólares especulativos que já assolavam o nosso mercado (IEC), convertendo-os assim em capital “produtivo” (IED) (?!?!). È dispensável dizer que isso não aconteceu nem vai acontecer. E é difícil acreditar que o próprio ministro levasse a sério a piada, pois o que vinha e continua a ocorrer em matéria de IED e IEC é o primeiro se transformar, por baixo dos panos, no segundo.
E toda a banca do distinto vinha envolta numa linguagem viscosa de vendedor de elixir do velho Oeste. As medidas de “ajuste” – ele preferiu empregar o eufemismo mais sutil, “consolidação fiscal”, copiado de um relatório do FMI - eram para que o Brasil crescesse a uma taxa média de 5,9% ao ano, durante o governo Dilma, e a taxa de investimentos passasse de 19% para 24%. Não se tratava de uma política recessiva, mas de um leve freio de arrumação. O crescimento desaceleraria no primeiro ano para 5%, depois deixaria o de Lula no chinelo.
Quanto a cortar nos juros, o principal componente do gasto público, que vinha sugando
espantosa quantidade de dólares produzidos pelas superemissões, nem uma palavra. Não precisava. O BC, em dezembro de 2010, lançou na praça uma “previsão” de que os juros básicos (Selic) aumentariam para 12,25% (nominais) até o fim de 2011 – aumento real de 39%. O pretexto, para variar, era a inflação produzida pela alta especulativa das commodities, sobre a qual o juro do Brasil não tem qualquer efeito. A taxa de crescimento do PIB de 2011, segundo o BC, corrigindo Mantega, não seria mais de 5%, mas de 4,5%.
Daí para frente, foi o que se viu. Veio o pacote de fevereiro: R$ 50 bilhões de corte no
Orçamento. Elevação do superávit primário. Cinco altas sucessivas da taxa básica de juros.
Campanha aberta do BC e da Fazenda, alavancada pela mídia, contra os aumentos de salário em geral, procurando transformar os sindicatos dos trabalhadores nos vilões da inflação. O receituário recessivo que conhecemos de longa data.
Resultado: abro aspas para uma longa citação com trechos retirados ipsis literis – ou quase – de duas matérias do camarada vice-presidente, doutor Carlos Lopes, publicadas nas edições da Hora do Povo, dos dias 3 e 10 de agosto.
“O governo federal gastou R$ 100,63 bilhões com juros no primeiro semestre, um aumento de 46% em relação ao mesmo período do ano passado, conforme o relatório de política fiscal do BC, divulgado no dia 29 de Julho.
“Além dos juros, as amortizações da dívida federal atingiram R$ 194,44 bilhões, um aumento de 7% em relação ao primeiro semestre de 2010 (Resultado do Tesouro Nacional, Vol. 17, Nº 6, Tabela A4 – Execução Financeira, julho/2011).
“Assim, em dinheiro (isto é, sem contar a rolagem ou refinanciamento da dívida), somando juros e amortizações, o governo federal passou aos bancos, em seis meses, R$ 294.511.584.199,32 (294 bilhões, 511 milhões, 584 mil, 199 reais e 32 centavos).
Essa quantia é nove vezes o que, no mesmo período, foi despendido com a Saúde (R$ 32.416.877.858,44), excluído o pagamento de restos do orçamento de anos anteriores. Quatorze vezes o dispêndio com a Educação (R$ 20.927.531.530,63). Vinte e cinco vezes a despesa, no mesmo período, de toda a Defesa Nacional (R$ 11.761.510.597,65). Duas mil novecentas e quarenta e três vezes o que se gastou em Saneamento (R$ 100.044.516,44). Vinte e quatro mil novecentas e oito vezes o gasto orçamentário com Habitação (R$ 11.823.598,72).
“No mesmo mês de junho, a que os números acima se referem, o estoque de capital externo no Brasil alcançou a espantosa cifra de U$ 1,38 trilhão, distribuídos da seguinte forma: IEC (Investimento Externo em Carteira), o capital puramente especulativo, U$ 669,41 bilhões; IED (Investimento Externo Direto), o capital que, em tese, se encontra sob a forma de propriedades, U$ 535,97 bilhões; OIE (empréstimos), U$ 180,91 bilhões.
Frente a esses números cavalares, nossas reservas de U$ 348,50 bilhões garantem o que, servem para que? Para ajudar a tapar o rombo da dívida pública americana?
“Em 2008, antes da guerra cambial, mas quando a desnacionalização da economia brasileira já
era mais do que excessiva, esse estoque de capital especulativo (IEC) em propriedade estrangeira montava a US$ 287,70 bilhões. Aumentou 132%.”
Se Mantega e Tombini tivessem combinado com os representantes do dólar organizado que cresceriam os juros no Brasil para absorver ao máximo o produto das superemissões, não teriam conseguido produzir melhor resultado para eles. Não podemos dizer que houve combinação. Mas não vamos dizer que não.
Em abril de 2011, o dólar em queda no Brasil foi cotado a R$ 1,60. Cinco meses antes, o exministro Delfim Neto havia alertado, com uma de suas frases de efeito características: “Com a taxa de câmbio de R$ 1,60 poderemos importar até o etanol de milho dos EUA”. Seria cômico se não fosse trágico, pois já estamos provando da fruta, inclusive porque as multinacionais que adquiriram em massa as usinas do etanol conseguiram produzir uma crise no abastecimento do produto, desde que o preço do açúcar alimentado pela especulação com as commodities disparou no mercado internacional.
Sem nenhum freio, as importações estão promovendo um massacre na nossa indústria, a ponto do emprego ter registrado queda de 0,2% no mês de junho, segundo a Pesquisa Industrial Mensal de Emprego e Salário (PIMES), divulgada pelo IBGE no último dia 11 de agosto. E aqui é importante voltar a frisar: não se trata de desaceleração no ritmo de crescimento, mas de queda mesmo. De desemprego, de trabalhadores no olho da rua. O número é de junho, vamos ver julho, com o crescimento negativo do PIB (menos 0,28%), a quantas anda a situação do emprego na indústria de transformação.
Comparado ao primeiro semestre do ano passado, o emprego caiu 9% no setor de papel e gráfica, 7,8% no setor de madeira, 3,1% no de vestuário e 2% no de calçados e couro. São os setores que o recente Plano Brasil Maior pretendeu compensar, estabelecendo uma desoneração de 100% sobre as contribuições para a Seguridade Social, em troca de 1,5% do faturamento para, parcialmente, substituir as fontes constitucionais de financiamento da Seguridade e da Previdência. De que isso adianta? Por que não enfrentar a causa do problema?
As “previsões” do BC para o crescimento do PIB, desde que ele a tinha fixado em 4,5%, em dezembro de 2010, foram sendo sistematicamente reajustadas para baixo e já estão a menos de 4%.
Vamos esperar o que para reduzir os juros e nos defender da agressão cambial? Vamos esperar o que para retomar o caminho do crescimento com base na expansão do mercado interno e do investimento público? Será que vai ser necessário ver a desaceleração cada vez mais acentuada do ritmo de crescimento do emprego em geral se transformar em queda para concluir que essa política não serve aos interesses do Brasil?
Precisamos virar rapidamente essa página, para retomar os projetos estratégicos. Todos eles, especialmente o da Telebras, porque as teles privatizadas não querem e não vão realizar a universalização da banda larga, e o Brasil necessita dela. Vamos parar de desviar recursos do nosso Tesouro para os representantes do dólar organizado através do pagamento de juros astronômicos. Podemos garantir que se isso for feito nunca mais teremos de ouvir que precisamos privatizar aeroportos porque não temos dinheiro para ampliá-los.
Companheiros e Companheiras
Amanhã, vamos entregar no TSE o nosso pedido de registro com os certificados de mais de 500 mil assinaturas que os cartórios eleitorais atestaram como válidas, dentro das mais de um milhão que colhemos nacionalmente, com grande esforço de todos, particularmente do nosso camarada Miguel Manso, Secretário de Organização do PPL, que coordenou todo esse processo, seguindo aquele princípio de que não viemos ao mundo para fazer nada fácil. E, haja papel...
Amanhã, 24 de agosto. Nesta data, há 57 anos, o presidente Getúlio Vargas disparava uma bala no coração, sacrificando a própria vida para deter um golpe de Estado. Como governante, ele legou ao Brasil além de uma obra monumental, que plantou profundamente os alicerces do projeto nacional-desenvolvimentista no solo da nossa pátria, o documento político mais vibrante, comovente e profundo da história brasileira, sua Carta Testamento.
Peço licença para ler um trecho:
“Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e
instaurei o regime de liberdade social. Tive de renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo. A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do salário mínimo se desencadearam os ódios. Quis criar liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobrás e, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre.
“Não querem que o povo seja independente”.
Camaradas, a luta continua a ser exatamente esta. E assim será enquanto os trabalhadores não forem livres e o Brasil não tiver conquistado sua completa independência.
A companheira Dilma, nossa querida presidenta, pode estar segura de que, apesar das críticas que não podíamos deixar de fazer a aspectos cruciais do governo que está sob seu comando, ela pode contar com o Pátria Livre tanto ou mais do que contou na sua eleição.
Além de preferirmos falar sempre pela frente, temos a firme convicção de que mais dia menos
dia a companheira Dilma, os companheiros do PT, os companheiros da base aliada considerarão naturais as teses aqui apresentadas, porque não estamos propondo novidade e a maioria dessas questões já haviam se tornado quase consensuais durante o governo Lula.
E nós acreditamos que a hora é de ir para a frente e não de recuar. “Avançar em relação às conquistas do governo Lula”. Avançar, porque é a isso que a situação internacional nos obriga, mas também nos permite. Permite. É importante ressaltar, porque vai muito longe de nós o desejo de dar murro em ponta de faca. Vamos avançar, que a vitória será nossa.
É o que o nosso inesquecível camarada Cláudio Campos, cuja lucidez e compromisso foram decisivos para que chegássemos até aqui, nos recomendaria nessa hora.
É o que devemos e iremos fazer.
Muito obrigado.
Brasília, 23 de agosto de 2011
PARTIDO PÁTRIA LIVRE
———
Voltar